O governo dos Estados Unidos abriu, nesta terça-feira (15), uma investigação formal contra o Brasil, em meio ao agravamento das tensões diplomáticas e comerciais entre os dois países. A apuração ficará a cargo do USTR (Escritório do Representante de Comércio dos EUA) e abrange temas como comércio eletrônico, importações, atuação de redes sociais, desmatamento e propriedade intelectual.
A medida foi notificada em comunicado oficial pelo representante comercial norte-americano, Jamieson Greer. “Sob o comando do presidente Donald Trump, eu abri a investigação sobre os ataques do Brasil às empresas de rede social americanas e outras práticas comerciais injustas”, afirmou.
A ação se baseia na chamada seção 301 da Lei de Comércio dos EUA de 1974, dispositivo que autoriza Washington a adotar retaliações unilaterais – tarifárias e não tarifárias – contra países considerados violadores de práticas comerciais justas. A China e a União Europeia já foram alvo desse mecanismo em disputas anteriores.
A ofensiva foi anunciada poucos dias após Trump informar, por carta enviada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a imposição de uma tarifa de 50% sobre os produtos brasileiros exportados aos Estados Unidos. No documento, o presidente americano também instruiu o USTR a abrir a investigação com base na seção 301, criticando diretamente a atuação do Supremo Tribunal Federal (STF), especialmente em decisões que atingem plataformas digitais dos EUA.
Entre os pontos levantados na investigação, os EUA alegam que o Brasil está retaliando redes sociais por não censurarem conteúdos políticos, o que restringiria a operação de empresas americanas no país. O relatório não menciona diretamente o STF, mas o tema foi citado por Trump, que criticou a derrubada temporária da plataforma X/Twitter em 2024 por determinação judicial.
Além disso, o texto menciona “tarifas preferenciais e injustas”, sustentando que o Brasil aplica taxas menores a produtos de países concorrentes dos EUA, comprometendo a competitividade de empresas norte-americanas.
A investigação também acusa o Brasil de falhas na aplicação de medidas anticorrupção e de transparência, sem, no entanto, detalhar quais situações motivaram a acusação. Outro ponto questionado é o suposto desrespeito à propriedade intelectual, com impactos diretos para setores criativos e tecnológicos dos EUA.
No setor energético, os Estados Unidos apontam a ausência de condições justas para o etanol americano. Segundo o USTR, o Brasil teria aumentado substancialmente as tarifas sobre o produto, em movimento contrário às expectativas de abertura de mercado.
Outro aspecto sensível diz respeito ao meio ambiente. A investigação menciona a alegada incapacidade do Brasil de aplicar de forma efetiva as leis de combate ao desmatamento ilegal, o que, segundo os americanos, também afetaria interesses comerciais.
Para o ex-secretário de Comércio Exterior e advogado Welber Barral, a medida guarda semelhanças com a recém-regulamentada Lei da Reciprocidade brasileira, que foi sancionada por Lula após o anúncio do tarifaço americano. Em sua avaliação, reportada pela Folha de S. Paulo, ele vê que a seção 301 pode resultar não só em elevação tarifária, mas também levar à imposição de cotas, restrições de importação. É, na prática, uma medida que até se parece com a Lei de Reciprocidade brasileira.
Em casos anteriores, como o da China, as medidas adotadas pelos EUA se estenderam por anos. Em 2018, durante o primeiro mandato de Trump, o governo americano aplicou tarifas punitivas que somaram US$ 370 bilhões em produtos chineses. Até hoje, muitas dessas sanções continuam em vigor, e foram inclusive estendidas para setores como o naval.
O Palácio do Planalto, por sua vez, ainda não se pronunciou sobre a nova escalada de Washington.